Terraplanismo: a religião da Terra plana
Imagem: Revista Superinteressante. |
Jóe José Dias
O que é o Terraplanismo?
Há certo tempo vemos uma discussão infundada a respeito da planificação terrestre. Essa teoria, denominada terraplanificação (ou terraplanismo), pressupõe, como o nome indica, que o planeta terra é um disco plano, onde o polo norte fica no centro e a Antártida circula todo o planeta, com um muro de 45 metros de altura, evitando que o oceano se esvaia no espaço sideral. Segundo os defensores desta ideia, os governos principais, com o apoio da Nasa, protegem esta borda e escondem a real forma do planeta no intuito de evitar que pessoas o escalem e saiam para fora do disco.
A
despeito da tolice que possa parecer o assunto, a crença de que o
planeta não é esférico vem ganhando milhares de adeptos todos os meses:
200 pessoas por dia, segundo os membros da STP (Sociedade Terra Plana), a
grande maioria delas nos EUA e na Inglaterra. Não à toa vem sendo
considerada a maior "teoria da conspiração" de nossos tempos.
Os
ciclos entre dia e noite são por eles explicados pelo posicionamento do
sol e da lua, que têm tamanhos similares (são esferas com 51 km cada).
Segundo essa crença, se movem similarmente em círculos de 4.828 Km sobre
o plano terrestre, sendo que as demais estrelas estariam a apenas 4.988
km acima daqueles corpos (sol e lua). Como estão ambos em lados
opostos, o sol apareceria durante o dia; a lua durante a noite,
iluminada pelo sol, ao que parece. Só que, pelo planeta ser plano e lua e
sol estarem paralelos, girando em círculos regulares sobre o disco
terrestre, como explicar então os eclipses? Simples, ora! É que existe
uma "antilua", invisível para nós, mas que cumpriria este papel.
Outra
conquista científica que os incomoda é a gravidade, inexistente segundo
suas concepções. Segundo estes "teóricos", a força gravitacional não
nos "empurra para baixo", mas é bem o inverso: o disco da terra é que
acelera para cima, a uma velocidade média de 9,8 m/s², movido por uma
misterirosa força, denominada energia escura. Inclusive se
apropriam de elementos da Teoria da Relatividade, de Einstein, para
tentar compreender se a terra avançará para cima gradativamente até
alcançar a velocidade da luz.
Nesse sentido, nada muito diferente do que faz algumas correntes religiosas, como os Testemunhas do Jeová,
por exemplo, que se apropriam de elementos já difundidos pela ciência
moderna, desfigurando-os no intuito de reler a bíblia sobre um novo
ponto de vista, a partir de novos paradigmas. Não à toa o medo que têm
de novas descobertas científicas.
Associam
(igualmente) à criação do planeta terra o Deus cristão medieval, aquele
que abraçava o universo e que o mantinha seguro, com a terra plana no
centro do cosmos e com todos os demais "objetos espaciais" a
circundá-la. Há correntes inclusive que afirmam categoricamente que a
terra está estática no espaço, contradizendo a versão da STP a respeito.
Mas
até aí temos outra contradição. Nosso planeta, o sol, ou qualquer outro
corpo celeste, exerce gravidade por ter uma grande massa disposta em um
formato ESFÉRICO. Isso faz com que tudo seja puxado para o mesmo centro
de gravidade, o núcleo do círculo. Se a Terra fosse plana, a gravidade
poderia até existir, mas sem força suficiente de atração reunida em um
mesmo ponto para "puxar as coisas para baixo", tendo, ao invés disso,
infinitos pontos de gravidade sem força suficiente para atração em
nenhum deles.
Não
bastassem esses problemas mal resolvidos, os terraplanistas afirmam
ainda ter um domo de vidro a circundar este planeta plano. E o melhor:
construído por seres extraterrestres! Este seria o responsável por
prender a atmosfera no planeta e teria concomitantemente a função de nos
impedir a ver a realidade externa a ele. Há gente que afirma,
inclusive, que a Austrália não existe e que o planeta marte é uma
estrela.
Mas
se a terra é plana, o que há abaixo dela? Bem, essa resposta não têm
para dar, embora creiam que seja composta majoritariamente por pedras.
Afirmam igualmente que todas as fotos tiradas do espaço são produtos de
editores de imagens e que os aparelhos de GPS são adulterados de fábrica
para nos fazer pensar (a nós todos) que estamos voando em linha reta
sobre uma esfera, quando a verdade é bem outra: voamos em círculos sobre
um disco.
Em
linhas gerais, são estes os principais argumentos que apoiam a
construção deste discurso absurdo, que não é capaz de explicar, por
exemplo, porque vemos, ao longe, no horizonte, primeiramente as velas de
um barco e não ele por inteiro, já que a terra é plana, ou porque dois
corpos com massas diferentes quando lançados a uma mesma altura não
tocam juntos ao solo, ou ainda porque não sejamos capazes de ver a
estrela polar no hemisfério sul, dentre outros.
Como
já dito, há vários grupos espalhados pelo mundo - inclusive no Brasil -
e, à medida que as contradições sociais vão aumentando em decorrência
da falência do capital, vai ganhando força essa teoria da conspiração. E
não é fortuito este crescimento! Há hoje uma crise enorme do discurso
científico em todo o mundo; a própria ciência se encontra engessada pela
ânsia de lucro de capitalismo, que a usa praticamente no intuito de
gerar lucro e novas mercadorias. Acresce a estes fatores uma educação
burguesa antidialética, praticista, fragmentada, tecnicista e aberta a
esses "discursos" criacionistas e não é difícil de compreender o
surgimento dessas religiões com estofo de ciência.
Há
tempos a burguesia é uma classe social reacionária, que reforça tudo
quanto é tipo de misticismo como forma também de auxiliá-la a manter
seus privilégios. Há tempos o capitalismo se mostra incapaz de resolver
as contradições por ele próprio criadas. Os abismos sociais e as
convunções por eles geradas são cada vez mais constantes. A massa de
pobres e de desesperançados só aumenta. A descrença na humanidade,
sempre individualizada, nunca contextualizada, só cresce. A agonia e a
perda de direitos vem a reboque dessas contradições... Eis aí um
mosaico rico e favorável para os misticismos e para esses discursos
idealistas vulgares, que buscam sempre as respostas na vontade divina,
na razão universal, na ideia absoluta ou em alguma outra forma de
abstração que se distancie da realidade concreta.
Por que é perigosa a crença da Terra plana?
Costumamos
rir, zombá-los, ignorá-los. Mas o fato é que vêm ganhando mais e mais
espaço essas ideias estapafúrdias. E perigosas. Muito perigosas. Não à
toa sua defesa por parte de praticamente todos os ideólogos da
extrema-direita contemporânea, ao redor do mundo.
É
que o terraplanismo é uma ideologia (falsa consciência) que visa a se
juntar a outras existentes (como o racismo, a homofobia, a xenofobia, a
xenofilia...) e que pretende agregar a elas outras já superadas e a
reforçar estas já existentes. Em seu bojo vem também a animalização dos
povos não europeus, a teocratização do estado, a destruição de direitos,
a injunção de valores reacionários. Em suma, pode até parecer loucura,
mas é uma loucura pensada.
Ora,
o terraplanismo não é uma invenção contemporânea. Tampouco é uma
criação que nasceu acabada, madura. Surgiu há uma boa dezena de séculos e
teve seu auge (no Ocidente), na Europa medieval. À época, à esta teoria
(que nada mais é que um conjunto de ideias amarradas) agregavam-se
valores já superados há muito pela ciência contemporânea.
Dai
a coerência em afirmar que esse pessoal quer trazer de volta o
"obscurantismo" da idade média, reintroduzindo não somente a Terra no
centro do cosmos, mas elegendo concomitantemente as bruxas do nosso
tempo para queimá-las em praça pública, provavelmente em Brasília, na
versão tupiniquim. E é difícil de se imaginar quem seriam essas bruxas
em épocas de grandes choques entre as classes sociais?
Não
à toa atacam veementemente Newton e - acreditem - Einstein. Aliás,
atacam a ciência em seu conjunto: atacam inclusive intelectuais que não
são do meio. Mas de fato, o mais agraciado com suas besteiras é, sem
dúvida, o socialista Albert Einstein. E tudo isso graças a uma das teorias mais revolucionárias de todos os tempos: a Teoria da Relatividade.
Ou seja, se por um lado se apropriam de um elemento específico da
complexa Teoria da Relatividade intuindo compreender a alienação forçada
de suas ideias, por outro a negam em seu conjunto.
E
articulam tais críticas não à toa, pois ela ajuda a provar a
esfericidade dos corpos celestes, dentre outras perturbações que causa.
Afirmam que não funciona, por exemplo, por não provar, segundo "informa"
o próprio Olavo de Carvalho,
a constância da velocidade da luz no espaço. Balela! É justamente o
contrário; vem sendo testada em limites que nem o próprio Einstein tinha
pensado e está sendo comprovada experimentalmente há 100 anos.
Inclusive, cientistas pensaram em modelos alternativos, mas a
"simplicidade e beleza de suas equações" mostra que a relatividade se
destaca como o melhor caminho, segundo a navalha de Occan - princípio
lógico que defende que qualquer fenômeno deve assumir o menor número
possível de premissas. Todos os cientistas que buscaram um modelo
alternativo, falharam, enquanto a Relatividade continua sendo a mais
utilizada e aplicada.
A
relatividade explica vários fenômenos da maneira mais simples possível e
de forma encadeada. A detecção de ondas gravitacionais, por exemplo, é
um dentre tantos fatos que corrobora com a teoria de Einstein. Se fosse
uma teoria inconsistente, esses subprodutos não seriam verificados.
Subprodutos que ele nem tinha pensado estão sendo descobertos...
Mas
a Teoria da Relatividade não é apenas uma simples teoria; é um conjunto
de postulados teóricos que inicia com a publicação, ainda em 1905, da
"Relatividade Especial", que substitui os conceitos independentes de
espaço e tempo da Teoria de Newton pela ideia de espaço-tempo como uma
entidade geométrica unificada. O espaço-tempo na relatividade especial
consiste de uma variedade diferenciável de 4 dimensões, três espaciais e
uma temporal (a quarta dimensão), munida de uma métrica
pseudo-riemanniana, o que permite que noções de geometria possam ser
utilizadas. É nessa teoria, também, que surge a ideia de velocidade da
luz invariante.
O
termo especial é usado porque ela é um caso particular do princípio da
relatividade em que efeitos da gravidade são ignorados. Dez anos após a
publicação da teoria especial, Einstein publicou a Teoria Geral da
Relatividade, que é a versão mais ampla da teoria, em que os efeitos da
gravitação são integrados, surgindo a noção de espaço-tempo curvo.
E
não foi somente isso que publicou e que vem sendo comprovado na prática
pelos astrônomos. Mas, como vem sendo ela a principal algoz destes
doentes, porque não citá-la como forma também de combater a estes
imbecis reacionários que pretendem incutir um conjunto de valores
negados há muito pela filosofia e pela ciência? Eis aí uma sugestão...
Um terraplanista morreu e foi pro céu. Lá chegando, conseguiu uma audiência com Deus. Então lhe perguntou
ResponderExcluir- Deus, por que vim embora tão cedo? Logo eu que fiz sempre o bem, sempre respeitei as pessoas... Por que eu? O senhor bem que poderia me dar uma nova chance, me levar de volta. O que acha?
- Está bem, meu filho. Acho Justo - lhe respondeu Deus. Vou enviá-lo de volta.
- Ah, obrigado, senhor. Que glória. Mas antes de eu ir, posso fazer uma última pergunta, se não for o importunar?
- Claro! Pois a faça, meu filho.
- A terra é plana, Deus?
- Não! É esférica, meu filho. Assim como todos os demais planetas.
De volta e assim que consegue, liga para seus amigos terraplanistas, dizendo: - Vocês não têm ideia de quem a Nasa comprou...
Que ipocrisia!
ResponderExcluirParabéns pela paciência de escrever esse texto. O terraplanismo vem se transformando em um dos maiores atrasos de vida no século 21. É a glória dos analfabetos científicos.
ResponderExcluirQue bosta de matéria, distorceram muita coisa, colocaram coisas que terraplanista não fala. Vocês querem é um povo gado mesmo.
ResponderExcluirhttps://praxis.blogs.sapo.pt/terrabolistas-do-mundo-todo-uni-vos-32249
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