Transporte Público: qual a saída?

Qual a Saída para o Transporte Público em Florianópolis: Uma Nova Licitação ou a Municipalização sob Controle dos Trabalhadores?

Desde que as grandes montadoras automobilísticas se instalaram no país, no governo de Juscelino Kubistchek na década de 1950, o transporte foi sempre organizado para privilegiá-las. Assim, alternativas como o transporte por hidrovias e sob trilhos, mais eficientes e menos poluentes, foram secundarizados. Até hoje existe uma clara preferência pelo transporte individual e rodoviário: para cada real que os governos investem em transporte público, doze reais são investidos no transporte rodoviário individual, ajudando a consolidar o atual modelo.

Um subproduto do modelo rodoviário foi o fortalecimento do papel das empreiteiras e construtoras, com a construção de estradas e rodovias, alimentando o grande crescimento imobiliário e a urbanização acelerada que houve no país a partir da década de 1950. Aqui se formou, com grandes empresários e políticos dos grandes partidos, uma poderosa máfia que nunca deixou que se rompesse com o atual modelo predominante de transportes.

Em Florianópolis as coisas não são diferentes. Somos uma das cidades líderes no país em automóveis por habitantes. O resultado é um trânsito infernal. Os congestionamentos são constantes em regiões estratégicas, como as pontes, a Av. Beira Mar Norte, a SC-401, a Av. das Rendeiras, o Sul da ilha e um longo etc. Os engarrafamentos crescem a cada dia. Quando chega o verão com os turistas o sufoco só aumenta.

O Transporte Público, que poderia ser uma alternativa, é na verdade parte do problema, pois está totalmente privatizado. Os usuários do transporte coletivo e os trabalhadores do setor são os que mais sofrem com o atual modelo de transporte público. Os ônibus são escassos, são muitas vezes lotados e possuímos a segunda tarifa mais cara do país. Os trabalhadores dos transportes sofrem com péssimas condições de trabalho, o perigo constante dos assaltos e o estresse de ter que conduzir ônibus lotados no trânsito. O resultado são muitos afastamentos por motivos de saúde originados no trabalho (chega a atingir 20% da categoria[i]).

Essas condições descritas são assim porque o transporte, que era para ser público, está nas mãos de empresários. Como toda empresa, o transporte rodoviário visa o lucro e não bem estar. Quanto mais lotados os ônibus e mais explorados os cobradores e motoristas, mais lucro. A permanência do transporte público na mão dos patrões do ônibus também impediu que se construíssem na cidade transportes alternativos ao rodoviário.

Os altos lucros dos empresários dos ônibus gera uma bola de neve: eles utilizam parte do que lucram para financiar as campanhas de muitos políticos, inclusive candidatos à Prefeitura e à Câmara de Vereadores, e depois continuam lucrando com a ajuda desses senhores, que votam leis privilegiando o transporte privado e o interesse de meia dúzia.

O único jeito de mudar essa situação é tirando o transporte público da mão dos empresários e trazendo para a mão dos usuários do transporte e dos trabalhadores. A isto chamamos municipalização.

Nós, do PSTU, somos o único partido nessas eleições que propõe a municipalização de todo o transporte público sob controle dos trabalhadores. Só assim poderemos ter um transporte rodoviário de qualidade e acessível para toda a população, além de investir em transportes alternativos, como o marítimo e as ciclovias.

Todos os outros candidatos defendem uma nova licitação como saída para o transporte público. No máximo, o candidato Elson Pereira (PSOL) propõe uma empresa pública para gerenciar o sistema de transporte, que continuaria na mão do setor privado. A candidata Janaína Deitos (PPL) é mais ousada e propõe a criação de uma empresa pública municipal de transportes para operar em alguns trajetos da cidade, mas sem tirar o conjunto dos transportes públicos da mão dos empresários.

Sem tirar o transporte da mão dos empresários não vão parar as tarifas caras que sustentam os altos lucros e nem vão parar as ameaças de demissão aos trabalhadores do setor.

Vamos conhecer melhor o atual modelo de Transporte Público da cidade e saber porque é urgente e necessária a municipalização sob controle dos trabalhadores.


Entendendo Melhor o Atual Modelo de Transporte Público de Florianópolis

As empresas de ônibus de Florianópolis estão há pelo menos 30 anos explorando o sistema de transporte coletivo. Em 2009 venceu o prazo de concessão e até hoje uma nova licitação ainda não foi realizada, as empresas operam sob um contrato de emergência. Recentemente foi debatido na Câmara de Vereadores o prazo da nova licitação para as empresas explorarem e (pasmem) ele poderá chegar a até 70 anos! O regime de concessão é uma tentativa frustrada de legitimar um monopólio privado na cidade em um serviço essencial, que resulta em altas tarifas e poucas linhas a disposição. Um verdadeiro absurdo!

O modelo de transporte “integrado” foi implantando pelo Governo Ângela Amin (PP) sob grandes protestos da população. Isso porque ela implantou uma “integração” baseada na baldeação de ônibus. Ou seja, ao invés de implantar linhas que ligam todos os pontos da cidade, economizar na construção de terminais, aumentar a oferta de linhas ônibus para toda a população e diminuir o tempo dos trajetos, a prefeitura dos Amins preferiu que as empresas atuais (que hoje são 5) tivessem o monopólio de cada região da cidade e os terminais foram construídos para fazer a baldeação entre essas regiões.

Com esse sistema (des)integrado, a tarifa aumentou e não ficou única como prometeu a prefeita. Também não houve a integração com a região metropolitana, abrangendo municípios como São José, Palhoça e Biguaçu. O tempo para integração de uma linha para outra sem precisar pagar uma nova tarifa é muito limitado e só funciona no mesmo sentido do trecho.

Ainda sobre os atuais terminais é importante esclarecer: eles foram construídos em terrenos doados pela Prefeitura e o dinheiro veio do BNDES. A farra com o dinheiro público foi tão grande que foram construídos alguns terminais de ônibus sem nenhuma utilização até hoje, como o do Saco dos Limões e o do Jardim Atlântico. Foram milhões de reais públicos jogados fora. Quem se beneficiou mais uma vez foram as próprias empresas de ônibus, pois a COTISA – Empresa que administra os terminais, é formada por 4 dessas empresas de ônibus e mais uma construtora.

Assim, cada vez que um ônibus entra nos terminais as próprias empresas pagam para elas mesmas taxas de utilização dos terminais que foram construídos com muito dinheiro público; essa taxa de utilização faz parte do cálculo da tarifa que todos pagam. Como se fosse pouco, a COTISA é quem detém todos os dados do transporte coletivo e toda vez que a Prefeitura ou qualquer outro órgão público quiser ter acesso a informações econômico-financeiras do setor ele precisa pedir a informação para a COTISA. Quando discutimos um aumento de tarifa ou um reajuste de salário dos trabalhadores do transporte, por exemplo, quem detém as informações e as disponibiliza são as próprias empresas sem qualquer controle do estado ou dos movimentos sociais.

Não por um acaso o transporte público tem sido um dos principais estopins das lutas populares na cidade. Tivemos as revoltas das tarifas de 2004 e 2005, que reverteram aumentos de passagens com o método das mobilizações de rua. Neste ano tivemos a grande greve dos trabalhadores do transporte coletivo de Florianópolis pela redução da jornada de trabalho e outras melhorias nas condições de trabalho. Também acontecem movimentos pela cidade reivindicando formas alternativas de transporte, como as bicicletadas. A insatisfação é grande com o modelo atual. As mudanças são urgentes e não podem ser pontuais!

Dário Berger (PMDB), sob o fervor do descontentamento popular, utilizou em 2004 como bandeira de campanha na disputa eleitoral com Esperidião Amin (PP), a abertura da caixa preta do transporte. Prometeu investigar e colocar para toda a população as condições reais do transporte que eram escondidas pelos empresários do setor com a concordância da Prefeitura e da Câmara de Vereadores. Isso o ajudou a se eleger. No entanto, não passou de uma grande promessa eleitoral que não se cumpriu até hoje. Isso porque o próprio Dário (PMDB) é um empresário do setor.

Para termos a dimensão do tamanho da exploração dos empresários dos transportes sobre a população basta compararmos o comportamento do preço da tarifa em relação a inflação. Em julho de 1994, no início do Plano Real, a tarifa era de R$0,30[ii]. Nos últimos 18 anos, o IPCA, que é o índice oficial de inflação no país, acumulou 306,25% de aumento[iii]. Caso fosse reajustada somente pela inflação oficial, teríamos hoje uma tarifa de apenas R$ 1,22. No entanto, o preço em cartão é atualmente de R$ 2,70, o que representa um reajuste de 800%. E o preço em dinheiro é de R$ 2,90, representando um reajuste de 866,67%. Ou seja, o preço da tarifa subiu nos últimos 18 anos mais de duas vezes e meia a inflação do período.

Dados de abril de 2012 da Prefeitura mostram que pelo sistema de transporte coletivo, tivemos durante todo o mês 4.509.093 passagens de ônibus[iv]. Além de não impor limites à alta dos preços das tarifas, para cada passagem que foi realizada, a Prefeitura pagou R$ 0,15 para os empresários do setor. Isso mesmo! Como se não bastasse a tarifa ser muito cara, pagamos novamente por ela através do subsídio da Prefeitura. Em 2008 esse subsídio era de R$ 0,12 por passagem e a partir de 2009 passou a ser R$ 0,15. Esse tipo de benefício existe e maioria da população nem conhece e o reajuste desses benefícios aos empresários é feito sem nenhuma transparência ou consulta a população. Confira abaixo os gastos com subsídios aos patrões do ônibus.


Ano
Gasto Anual da Prefeitura com Subsídio
2008
 R$ 4.488.664,73
2009
 R$ 8.083.676,08
2010
 R$ 8.309.924,50
2011
 R$ 8.148.754,44
Fonte: Prefeitura de Florianópolis

A lei complementar 199 de 2005 estabeleceu para os empresários do setor praticamente a isenção do Imposto Sobre Serviços (ISS). Pagam apenas uma alíquota de 0,01% (isso mesmo, apenas 0,01%!).

Assim os empresários do setor cobram altas tarifas com a conivência da Prefeitura e da Câmara de Vereadores. Ainda por cima ganham subsídios e tem praticamente isenção de impostos da prefeitura. E uma série de outras regalias. Isso tudo possibilita muitos lucros para os empresários do setor à custa de um transporte cada vez mais caro, inacessível e sem qualidade.


Por Que Municipalizar o Transporte Público?

A constituição federal de 1988 estabelece o transporte público como um serviço essencial. Todo o sistema de transporte público da cidade foi construído com dinheiro público, seja governamental ou do nosso próprio bolso com as caras passagens. Inclusive os ônibus são pagos por nós, pois faz parte do cálculo da tarifa a renovação da frota. Nada mais legítimo e coerente do que reivindicar a estatização completa do sistema de transportes público da cidade e colocá-lo na mão dos usuários e trabalhadores do setor para que definam como organizá-lo. Acompanhe as medidas que o PSTU propõe para o transporte na cidade:

  • Redução emergencial da tarifa de ônibus! Tarifa única no cartão e no dinheiro! Tarifa única de verdade valendo para todo o dia tanto em trajetos de ida como de volta
  • Passe-livre de forma imediata para estudantes e desempregados! Rumo a tarifa zero para toda a população!
  • Debate com os usuários do sistema sobre as necessidades de ampliação de horários e linhas de ônibus!
  • Redução da jornada de trabalho para os trabalhadores do transporte para 30h semanais sem redução de salários e sem banco de horas ! Valorização salarial da categoria com reajuste geral de salários e estabilidade no emprego para todos! Atendimento das demais pautas de reivindicações da categoria! 
  • Pela investigação das contas do transporte público sob controle dos movimentos sociais e pela punição rígida de corruptos e corruptores!
  • Estatização/municipalização do sistema de transportes (ônibus, terminais e garagens das empresas de ônibus) sob controle dos trabalhadores do transporte e usuários do sistema! Construção de um sistema integrado de transportes que diminua progressivamente a necessidade de baldeação dos ônibus e a garantia de faixas exclusivas para ônibus no trânsito da cidade! Que a Prefeitura organize transportes alternativos públicos, estatais e controlado pelos trabalhadores, como o marítimo, sob trilhos e ciclovias! Por um Plano de Mobilidade Urbana para a Região Metropolitana de Florianópolis debatido e deliberado pelos movimentos sociais ligados a classe trabalhadora!
  • Criação de um Conselho Municipal de Transportes baseado na organização de trabalhadores (movimentos sociais, sindicatos, associações de bairro e etc.) sem a participação da burguesia que defina a política a ser adotada e como se dará o financiamento da área!
  • Lutar para que invista no país 2% do PIB no transporte público e estatal!



[i] Dados do SINTRATURB – Sindicato dos Trabalhadores em Transporte Urbano, Rodoviário, Turismo, Fretamento e Escolar da Região Metropolitana de Florianópolis.
[iii] Dado construído a partir de informações do IPEA. Disponível em: http://www.ipeadata.gov.br/ Acessado em: 28/08/2012.

Comentários

  1. O texto informativo é relevante e traz a tona muitos pontos da atual política dos transportes de Florianópolis, porém fica evidente a extrema imparcialidade, além disso as soluções apresentadas são completamente inviáveis, dignos da alienação de uma mente sedenta pelo poder acusando os ricos de serem ricos, além do mais apoderar-se do que não eé seu não se chama municipalização, se chama roubo!

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  2. O texto toca com coragem naquilo que os outros candidatos não falam: o transporte público é todo ele alimentado com dinheiro público e o único papel do setor privado é viabilizar seu lucro privado. Nada mais justo e necessário do que a municipalização com seu controle democrático.

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