Legalizar as drogas para combater o tráfico

Américo Gomes, advogado do Ilaese


O Imperialismo e as drogas

Não é novidade que o comércio de drogas e o imperialismo sempre mantiveram um grande envolvimento, como testemunham as guerras do ópio (1840-1860), quando a Inglaterra, gerente do tráfico de ópio, invadiu e derrotou a China para manter seu comércio.

Durante a Segunda Guerra Mundial, a OSS (Oficina de Serviços Estratégicos), antecessora da CIA, fez acordos com a máfia italiana e Lucky Luciano, um dos principais traficantes da época, em troca de informações de espiões nazi-fascistas. Nesta sociedade (parceria), tanto ele quanto vários mafiosos foram libertados das prisões. Quando voltou a Itália, em 1943, pelas mãos da OSS, Luciano construiu seu império através da heróina.

A produção massiva de drogas foi possível somente com a Revolução Industrial. Como explica Osvaldo Coggiola, em “Questões de história contemporânea”, a grande transformação das economias monoprodutoras em narcoprodutoras (…) ocorreu durante os anos oitenta, quando o preço das matérias-primas despencaram no mercado mundial: açúcar (-64%), café (-30%), algodão (-32%), trigo (-17%). A crise econômica mundial exerceu uma pressão formidável em favor da narco-reciclagem das economias agrárias, que redundou em um aumento excepcional de oferta de narcóticos nos países industriais e no mundo todo.

Em dezembro de 1989, treze mil marines invadiram o Panamá com o objetivo de controlar o Canal do Panamá e também o tráfico pelo canal. Afinal, por aí, somente o cartel de Medellín, com a ajuda de Noriega, exportou para os EUA, entre 1984 e 1986, 2 toneladas de cocaína e 500 toneladas de maconha. Manoel Antônio Noriega, ex-agente da CIA e chefe da polícia panamenha, que participou do financiamento das guerrilhas de direita contra o governo sandinista da Nicarágua (operação conhecida como “Irã-Contras”, responsável pela compra de armas no Irã para financiar a guerrilha anti-sandinista), deixara de ser um homem de confiança por querer os lucros do tráficos todos para si.

Os rebeldes Mujhaidines (base da Al Qaeda, de Osama Bin Laden) produziam ópio. A produção passou de 250 para 800 toneladas durante o tempo em que a CIA enviou armas para a guerrilha lutar contra os soviéticos. Os talibãs ordenaram, em julho de 2000, a destruição dos cultivos de papoulas. A produção de drogas foi retomada depois da invasão militar dos EUA ao Afeganistão, em 2001, e hoje o país supera a Colômbia, sendo o maior produtor mundial de drogas (principalmente ópio e heroína). Esta cifra se torna ainda mais impressionante se pensarmos que, em 2003 por exemplo, o negócio faturou mais de 2,3 bilhões de dólares, representando mais da metade do PIB do país. O Afeganistão produz atualmente 92% do ópio mundial.

Falando em Colômbia, este país produz cerca de 80% da Cocaína do mundo, representando o narcotráfico cerca de 10% do seu PIB. Na década de 1980, com a queda dos preços das matérias-primas no mercado mundial, os fazendeiros deixaram de produzir café para produzir cocaína. O governo colombiano aprovou empréstimos externos, com dólares trocados por pesos, possibilitando que o narcotráfico ampliasse a atividade econômica; concedeu anistias tributárias, legalizando assim os investimentos dos narcotraficantes. Este plano ficou conhecido como a “Ventanilla Siniestra”. À época, o mega-traficante Pablo Escobar era deputado. Políticos, congressistas e presidentes (como Ernesto Samper e Álvaro Uribe) são acusados de terem pertencido e serem financiados pelos cartéis.

Os EUA e a União Europeia investem bilhões de dólares com o chamada “Plano Colômbia”. No entanto, as áreas de cultivos de coca, que compreendiam cerca de 50.000 hectares entre 1986 e 1996, após o Plano Colômbia chegaram a 169.800 hectares (dados de 2001).

O processo contra o coronel Oliver North, envolvido no caso “Irã-Contras”, como constata o jornal San Jose Mercury News, demonstrara por nomes e fatos que por vários anos a CIA e a DEA estiveram em contato com os chamados cartéis colombianos, protegendo a entrada de drogas nos Estados Unidos. Tal operação servia para encontrar fundos ilegais para financiar as forças opositoras ao governo sandinista da Nicarágua.


Guerra à juventude negra e pobre

E quem são os mais prejudicados com a expansão deste mercado? Os jovens. Em 2002 foi publicado um estudo tendo como base o envolvimento de jovens no tráfico, na cidade do Rio de Janeiro, no qual se constatou um aumento no número de crimes na década de 1990 e, ao mesmo tempo, a redução da idade do ingresso das crianças no narcotráfico. A média de 15-16 anos nos anos 1990 caiu para 12-13 na década seguinte . Os jovens são, em sua maioria, pobres, negros e com baixa escolaridade.


Pela legalização das drogas

Sob a égide do capitalismo a droga é uma mercadoria; o tráfico se organiza como uma empresa que objetiva o lucro. Uma empresa com milhões de trabalhadores super precarizados, sem algum direito trabalhista e vivendo sob um regime “do medo”, suscetíveis a torturas e mesmo à morte em qualquer momento.

No tráfico de drogas não existe um livre-mercado. A distribuição e a venda são comandadas por um número reduzido de grupos hierarquizados que controlam a fase mais rentável: a transformação da pasta-base em cocaína (no caso desta droga). Enfim, o narcotráfico é o sonho de produção de todos os grandes capitalistas. Em regiões como a Califórnia, maior produtora de maconha do mundo, e no Nordeste brasileiro, a sua produção é comandada pelos latifundiários da droga.

A luta contra o narcotráfico, por sua vez, exige também a luta contra a lavagem de dinheiro, por meio de um ataque a todo o sistema de circulação de capitais, punindo exemplarmente os grandes traficantes, fazendo a reforma agrária nas terras em que se produz a droga ilegalmente, confiscando dinheiro e propriedades advindas do tráfico e da lavagem do dinheiro oriunda deste, acabando com o sigilo bancário e centralizando o crédito nas mãos do Estado, através da nacionalização dos bancos.

Com essas medidas o governo deixaria de gastar bilhões em policiamento e repressão e arrecadaria outros tantos bilhões com impostos de quem comprasse drogas em locais legalizados. Estes impostos, por sua vez, poderia ser (e seriam) aplicados em Saúde, Educação, atividades culturais e na recuperação de químicos dependentes. Ademais, com o controle estatal da droga, o Estado produziria drogas “mais puras”, impedindo a adição de outros componentes químicos às drogas ainda mais prejudiciais à saúde do dependente. Legalização das drogas significa, junto aos camponeses, em uma política de substituição de cultivos.

As drogas seriam qualificadas para o consumo: “médico, terapêutico e recreativo”. E os consumidores cadastrados para o consumo, com o acompanhamento de um centro de saúde. Com isso, o uso da droga seria “controlado”. Os dependentes químicos se submeteriam a um tratamento público, eficaz e humanitário, com recursos do Estado, que forneceria uma rede pública com centros de tratamento e profissionais qualificados e bem treinados.

Em paralelo, o governo combateria o consumo por meio de campanhas educativas que explicassem os malefícios do consumo exagerado de toda e qualquer droga.

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Comentários

  1. Gente, olhem este link:
    http://g1.globo.com/ciencia-e-saude/noticia/2013/12/impacto-de-droga-descriminalizada-na-saude-publica-varia-entre-paises.html

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