Sobre as tarefas classistas

Wagner Miquéias F. Damasceno

Algumas pessoas têm compartilhado, nas redes sociais, mensagens que pedem impeachment da presidenta Dilma Roussef. Outras pessoas, ao contestarem esses ataques, em geral, acabam defendendo o governo e atenuando seus ataques e os escândalos de corrupção. Parece que a falsa polarização entre PT e PSDB continua a nos confundir, mas, agora, na ideia equivocada da defesa irrestrita de um governo democrático frente às ameaças da direita golpista. Convidamo-los à uma breve recapitulada, de outubro do ano passado, até aqui.

Nas eleições passadas, o PSTU lançou a candidatura de Zé Maria para a presidência da república. Zé Maria é um operário que nunca mudou de lado e, naquelas eleições, defendeu um programa político voltado para a classe trabalhadora. Já no segundo turno, o PSTU defendeu o voto nulo, pois nem Dilma (PT) e nem Aécio (PSDB) governariam para os trabalhadores e a juventude brasileira. Ao contrário: na nossa avaliação, qualquer um dos dois que vencesse atacaria os direitos dos trabalhadores e lançaria uma verdadeira ofensiva contra os serviços públicos no país.

A vitória de Dilma, do PT, foi apertada. Aécio expressou os votos da direita tradicional, mas, também, acabou canalizando (de forma distorcida) os votos de milhões de trabalhadores insatisfeitos com o governo do PT, seus ataques e escândalos de corrupção.

Muita gente, de forma sincera e, até mesmo, ingênua, defendeu seu voto em Dilma qualificando-o como um voto "crítico". Muitos desses e, tantos outros, esperavam ver um governo do PT à esquerda. Mas a realidade (nacional e internacional) não dava fundamentos para essa expectativa. 

Antes do fim do ano, Dilma anunciou a sua equipe ministerial e chocou muitos dos seus eleitores com sua declaração de intenções de governo que, por sinal, eram contrárias àquilo que ela defendeu durante as eleições*.

Dilma atacou os direitos trabalhistas no dia 30 de dezembro de 2014 ao alterar, através das medidas provisórias ns. 664 e 665, as regras do seguro desemprego, abono salarial, seguro defeso, pensão por morte, auxílio-doença e auxílio- reclusão. É como se o governo mandasse a conta da crise econômica que se avizinha para os trabalhadores pagarem, protegendo, mais uma vez, a burguesia e os credores da dívida pública.


              "Cabe salientar que o Governo Federal justifica a adoção dessas Medidas no contexto de ajuste das contas públicas, como parte integrante do esforço fiscal para 2015 de alcançar um superávit primário (economia para pagar juros da dívida) de 1,2% do PIB (Produto Interno Bruto), alegando que poderão gerar uma economia de gasto de R$ 18 bilhões. Deve-se registrar, no entanto, que as várias medidas de apoio e benefícios ao setor empresarial adotadas pelo próprio Governo nos últimos anos – como a redução de alíquotas de IPI e desonerações, entre outras –  representaram cerca de R$ 200 bilhões a título de renúncia fiscal, ou seja, de recursos que o Tesouro Nacional deixou de receber. Não há como justificar, portanto, que o ajuste se inicie exatamente pela parcela mais vulnerável da população (DIEESE, 2015, p. 02).
Nomear um banqueiro para o ministério da fazenda, uma latifundiária para o ministério da agricultura e um inimigo dos trabalhadores da educação para o ministério da educação foram algumas das medidas do governo do PT. Algumas pessoas, de forma incrédula, chegavam a dizer que o PT vencera, mas quem assumira era o PSDB, tendo em vista as práticas abertamente neoliberais."

Paralelamente, assistimos a grave crise da Petrobras, resultado da privatização iniciada no governo do PSDB e continuada no governo do PT, com o avanço das terceirizações e os leilões dos poços do pré-sal e do pós-sal. Em consequência, a Petrobras está enredada em casos de corrupção que envolvem grandes empreiteiras como a Odebrecht, OAS, Queiroz Galvão e UTC. Algumas dessas empresas patrocinaram o Golpe de 1964 e, atualmente, financiam a campanha de vários partidos políticos, agora no regime "democrático", como é o caso da Odebrecht, que financiou – ao mesmo tempo – a candidatura da ex-guerrilheira Dilma Roussef (PT) e do bon vivant Aécio Neves (PSDB).

Entretanto, muitas pessoas questionam como esse assunto é tratado em grandes veículos de comunicação, e criticam a blindagem feita, especialmente, ao PSDB. Ao assistirem nos principais jornais da rede Globo algo sobre a operação Lava Jato da Polícia Federal, responsável por investigar os casos de corrupção na Petrobras, muitas pessoas se perguntam se não trataria de uma grande armação contra o PT, afinal, parece que toda a mídia  resolveu atacar a Petrobras e responsabilizar o governo Dilma por toda a corrupção no país. E, alguns, – tendo em vista o histórico golpista da Rede Globo e seu, cada vez mais conhecido, apoio à Ditadura civil-militar – se perguntam se isso tudo não estaria sendo feito para desestabilizar o governo do PT e pavimentar o caminho para um regime mais autoritário.

Por isso é importante diferenciar a parte do todo. A Globo é a grande empresa midiática da burguesia do Brasil. No entanto, a Globo não confia no PT, embora o PT governe para a burguesia. Quando essa grande empresa midiática resolve pautar um assunto, devido a sua presença massiva – de norte a sul do país, – através, da tv, do rádio, das revistas, jornais, portais de internet etc., – é praticamente impossível ficar alheio.

No entanto, se a burguesia é heterogênea, isto é, possui frações com interesses diferentes, é natural que os meios de comunicação também sejam heterogêneos. E isso é verdade, pois nem toda mídia faz campanha contra o PT. Outras grandes empresas midiáticas não dão o mesmo tratamento ao tema da crise da Petrobras, como a Record, por exemplo. Ou seja, uma parte da grande mídia reconhece no PT um governo que, também, é seu. O PRB, partido aliado do PT, é presidido por Marcos Antônio Pereira**que já administrou o Grupo Record; um partido que abriga o senador Bispo Crivella, sobrinho do Bispo Edir Macedo, que possui o controle acionário da Rede Record. Aliás, é importante lembrar que Dilma Roussef, em julho do ano passado, figurou por cerca de duas horas na inauguração do Templo de Salomão da Igreja Universal, em São Paulo, junto com outras autoridades, numa demonstração de prestígio e poder desse setor (COM, 2014)***.

Claro, como sabemos, essas alianças não não possuem prazos limitados. Aliás, é importante dizer que a própria Globo defendeu diversas medidas e posições do governo, como a defesa da Copa do Mundo e das Olimpíadas no Brasil e justificou a repressão aos movimentos sociais cotidianamente.

Na esteira da crescente contestação social contras as medidas do governo e da crise da Petrobras, o PSDB tenta se apresentar como uma alternativa ao governo do PT, agora, após as eleições. Mas sabemos que o PSDB é inimigo dos trabalhadores, da juventude, das mulheres, negros e LGBTs.

É progressivo que, hoje, milhões de trabalhadores compartilhem em sua memória coletiva o que foram os oito anos do governo FHC, do PSDB. Contudo, é fundamental que, hoje, entendamos que o PT, também, é inimigo dos trabalhadores, da juventude, das mulheres, dos negros e dos LGBTs.

A realidade é muito superior ao falso dualismo entre PT e PSDB! Vemos hoje, no mundo, manifestações massivas que expressam um profundo desejos por mudanças! Milhares de pessoas tomam as ruas na Europa querendo uma alternativa ao capitalismo e à democracia burguesa, sua carapaça.

Certa vez, a ex-primeira ministra britânica e ícone do neo-liberalismo, Margaret Tachter, certa vez, disse que "Não havia alternativas". Atacando os trabalhadores, a ex-primeira-ministra britânica queria ferir de morte a esperança proletária de superar a exploração. No fundo, é isso que o PT e o PSDB querem. Ambos querem que acreditemos que não há alternativas para além do que representam e do que propõem.

Para nós, do PSTU, é preciso defender os direitos dos trabalhadores e avançar na construção de uma alternativa de poder ao PT e ao PSDB. E isso só será possível através da organização dos explorados e oprimidos sob o classismo.

Os operários da Volkswagen, em São Paulo, indicaram o caminho ao pararem o trabalho até a readmissão de 800 companheiros demitidos. Um outro exemplo vem do Paraná. Os servidores estaduais fizeram uma paralisação heroica contra o “pacote de maldades” do governador Beto Richa, do PSDB. Mobilizaram-se e ocuparam a Assembléia Legislativa do Paraná (ALEP) até que o projeto do governador fosse retirado de pauta. A pressão dos trabalhadores foi tanta que os deputados chegaram dentro de um camburão! E na hora de saírem, os trabalhadores ordenaram para os deputados, em uma só voz: “Sai de camburão! Sai de camburão! Sai de camburão!”

Podemos extrair uma importante lição disso: somente os trabalhadores podem combater os corruptos e corruptores e expulsar esses parasitas da gestão do Estado! A corrupção, a mentira e a fraude fazem parte do funcionamento do capitalismo. Para extingui-las é preciso que os trabalhadores assumam o controle da produção social e passem a organizar, coletivamente, a sociedade. Afinal, quem você gostaria que administrasse a Saúde, a Educação, o Transporte, a Previdência e a Segurança do nosso país: esses trabalhadores organizados que trabalham, no dia a dia em hospitais, postos de saúde, escolas, universidades e rodovias ou aqueles parasitas engravatados que representam os interesses dos empresários?!
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*Talvez a primeira manifestação pública de desacordo, vindo das próprias fileiras do PT, tenha sido esta: http://www1.folha.uol.com.br/colunas/andresinger/2014/11/1541738-sinais-trocados.shtml
**Ver: http://www.prb10.org.br/pessoas/marcos-pereira-3/.
***Com direito à execução do hino do Estado de Israel num templo religioso.

Referências:
DIEESE. Considerações sobre as medidas provisórias 664 e 665 de 30 de dezembro de 2014. Disponível em: http://goo.gl/YzUPV9. Acesso em: 21 fev 2015.

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